A sentença arbitral, que se caracteriza como título executivo judicial (CPC, art. 515, VII), é proferida pelo árbitro ou tribunal arbitral, mas executada por um juízo estatal. O cumprimento de sentença há de ser proposto perante um juízo estatal, seguindo as regras gerais de competência (CPC, art. 516, III).
Ao árbitro ou tribunal arbitral cabe proferir a sentença, sendo do juízo estatal a competência para processar e efetivar o cumprimento da sentença.
Sendo a sentença arbitral ilíquida, é necessário liquidá-la, mas quem tem competência para fazê-lo? A liquidação há de ser processada perante o juízo arbitral ou perante o juízo estatal, que tenha competência para o cumprimento da sentença?
Há quem entenda que a liquidação deve ser proposta perante um juízo estatal, salvo estipulação em contrário na convenção de arbitragem1; as normas de competência, relativas ao cumprimento de sentença, seriam igualmente aplicáveis à liquidação da sentença2. Por outro lado, há quem afirme que a competência é do árbitro, a não ser que a própria convenção de arbitragem tenha afastado essa sua competência (o que não é comum), deixando ao juízo estatal a atribuição de estabelecer o quantum debeatur3.
O árbitro, que é juiz de fato e de direito, deve julgar a disputa havida entre as partes. O julgamento integral engloba tanto o an debeatur como o quantum debeatur. Se ao árbitro cabe julgar todo o litígio, sendo a sentença ilíquida, é dele a competência para complementar a sentença, a não ser que as partes tenham suprimido da sua competência a análise dos valores eventualmente devidos.
É relevante destacar, porém, um detalhe: o árbitro, ao proferir a sentença, encerra seu ofício, prestando jurisdição. Depois da sentença, só lhe cabe apreciar embargos de declaração eventualmente opostos. Não há, rigorosamente, previsão de nova fase ou de liquidação da sentença. Na verdade, quando o árbitro profere sentença ilíquida, ele está a proferir uma sentença parcial, deixando o outro capítulo para ser examinado posteriormente. E o § 1º do art. 23 da lei 9.307/96 (lei da arbitragem) prevê que os árbitros podem proferir sentenças parciais. Logo, é possível que o árbitro profira uma sentença, com a definição da responsabilidade e do an debeatur, complementando-a, posteriormente, com outra, em que definirá o quantum debeatur.
Significa que, havendo sentença arbitral ilíquida, é o próprio árbitro quem deve promover a liquidação, complementando a sentença, a não ser que haja disposição em contrário na convenção de arbitragem, mediante a qual se afasta do árbitro essa competência, hipótese em que caberá ao juízo estatal promover a liquidação da sentença arbitral.
Há, porém, uma situação peculiar que merece registro.
Imagine a hipótese de a sentença arbitral ser líquida e, portanto, apta à execução. Basta pensar nos exemplos de sentença arbitral que imponha uma prestação de fazer ou de entrega de coisa certa. Instaurada a execução, e sobrevindo o pedido de conversão da obrigação em perdas e danos (CPC, art. 499), surge a necessidade de uma liquidação incidental, um dos tantos incidentes cognitivos de competência do juízo da execução. Nesse caso, a competência é do juízo da execução: é dele a competência funcional para resolver os incidentes cognitivos da execução, e esse é mais um deles.
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1. CARMONA, Carlos Alberto. A arbitragem no processo civil brasileiro. São Paulo: Malheiros, 1993, p. 112-113.
2. ASSIS, Araken de. Manual da execução. 18ª ed. São Paulo: RT, 2016, n. 92.3, p. 529.
3. CAHALI, Francisco José. Curso de arbitragem. São Paulo: RT, 2011, n. 11.7, p. 263-266;
DINAMARCO, Cândido Rangel. A arbitragem na teoria geral do processo. São Paulo: Malheiros, 2013, n. 71, p. 186-187;
VALENÇA FILHO, Clávio de Melo. “Sentença arbitral e juízo de execuções”. Estudos de arbitragem. Clávio de Melo Valença Filho; João Bosco Lee (coords.). Curitiba: Juruá, 2008, p. 208-209.
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Por Leonardo Carneiro da Cunha, sócio do escritório da Fonte, Advogados. Professor adjunto da Universidade Federal de Pernambuco.
Fonte: Migalhas – terça-feira, 24 de janeiro de 2017
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