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A arbitragem e a mediação são duas importantes ferramentas jurídicas que permitem a solução, fora do Poder Judiciário, dos conflitos de diversas naturezas que surgem no dia a dia das relações jurídicas e de negócios privados entre as pessoas, entre as empresas e entre as pessoas e as empresas. Os conflitos existem também nas numerosas e variadas relações entre os particulares e a administração pública, cada vez mais frequentes em nosso país.
Para o uso eficaz da arbitragem e da mediação no Brasil, e para dar a esses institutos a necessária segurança jurídica na solução dos conflitos, foi preciso editar legislação moderna e tecnicamente adequada para regular sua a aplicação. E mais: Era indispensável que essa legislação fosse reconhecida pelo Judiciário, que fosse praticada pelos advogados, que fosse utilizada pelas empresas e pelos cidadãos em geral.
Há quase 20 anos foi promulgada a Lei de Arbitragem brasileira e esse instituto passou a ser mais e mais utilizado e apoiado pelos tribunais do país. Foram duas décadas de extensa produção doutrinária e de rica jurisprudência especializada. Nesse tempo, surgiram instituições científicas e instituições promotoras de boas práticas na arbitragem, câmaras e centros de excelência na administração dos procedimentos arbitrais. Consolidou-se na comunidade arbitral um número significativo de árbitros experientes e reconhecidos, no país e no exterior, que passaram a julgar com rapidez e conhecimento os conflitos levados à arbitragem.
Ainda que apenas a arbitragem fosse regulada por lei, a cultura da solução extrajudicial de conflitos passou a ser melhor avaliada e mais aceita pela sociedade. Paralelamente à arbitragem outros métodos adequados passaram a ser estudados e praticados, especialmente a mediação privada, a mediação judicial, a conciliação, os dispute boards, a autocomposição administrativa, criando-se assim um verdadeiro sistema multiportas à disposição da sociedade para a escolha da ferramenta jurídica mais adequada para a pacificação dos conflitos.
O ano de 2015 foi palco de um notável avanço nesse sentido. O Congresso Nacional promoveu extenso debate parlamentar e com a sociedade civil sobre métodos de solução extrajudicial de controvérsias e aprovou (i) a modernização da Lei de Arbitragem (Lei 13.129/2015, alterando a Lei 9.307/1996); (ii) a criação da Lei de Mediação, marco legal do instituto no Brasil [Lei 13.140/2015, primeira parte]; e (iii) a instituição da Autocomposição Administrativa de Litígios com a Administração Pública (Lei 13.140/2015, parte final).
Ao lado dessa legislação especial, o novo Código de Processo Civil, a viger a partir de março de 2016, acolheu em diversos de seus dispositivos, o uso da arbitragem, regulou o uso da mediação e promoveu a prática da conciliação para resolver litígios antes de sua judicialização ou para solucioná-los no curso do processo judicial.
Com isso, a partir de 2015, o país passou a estar dotado de um conjunto de instrumentos legais modernos e sistematizado para dar segurança jurídica e confiança aos operadores do Direito e à sociedade em geral para o uso cada vez maior das várias ferramentas de solução adequada e extrajudicial de conflitos.
Haverá com certeza um período de adaptação da sociedade e de evolução da jurisprudência quanto à extensão e quanto à adequação dos métodos de solução de controvérsias fora do Judiciário. Foi o que aconteceu quando da promulgação da Lei de Arbitragem, em 1996. Mas a edição da nova legislação em 2015 abre espaço para o uso mais frequente dos métodos adequados e extrajudiciais de solução de conflitos. E abre espaço para a ampliação do uso da arbitragem, da mediação e da conciliação para a solução de conflitos nas relações trabalhistas e nas relações de consumo, como previsto no projeto de lei de arbitragem. Os dispositivos que permitiam a ampliação da arbitragem para essas duas importantes áreas, no entanto, foi vetada em 2015 quando da sanção das alterações à Lei de Arbitragem.
Apesar de praticada em outros países, cabe registrar que também a arbitragem tributária ficou fora da reforma de 2015. Com certeza aliviaria o Judiciário da maior parte dos mais de 100 milhões de processos judiciais em andamento no país, nos quais a administração pública figura como parte em mais de 50% dos casos, a maioria por questões tributárias, como mostrou levantamento do conselho Nacional de Justiça.
Não há dúvida de que árbitros especializados, independentes e imparciais, escolhidos por fisco e contribuintes, poderiam resolver em menor tempo e com maior precisão, fora do Judiciário, muitos dos conflitos em matéria tributária que hoje são da competência exclusiva de juízes togados e que, decisivamente, contribuem para o volume e a morosidade de processos judiciais tributários que atolam o Judiciário do país.
Implantar a arbitragem tributária exigiria no entanto regulação legal completa para harmonizar seu uso com a necessária segurança jurídica e a indispensável isonomia entre as partes envolvidas, fisco e contribuintes, ante a multiplicação de conflitos decorrentes da complexidade do sistema tributário brasileiro.
A arbitragem tributária foi mencionada apenas en passant pela Lei de Mediação de 2015 (Lei 13.140/2015, parte fina), de forma ainda insuficiente para ampliar seu uso no país. A simples menção da arbitragem tributária em lei editada no ano de 2015, no entanto, é clara indicação da importância do assunto, a merecer mais estudo e reflexão pelos três poderes da República – Legislativo, Executivo e Judiciário — e pela sociedade como um todo.
É o que tem sido feito por instituições privadas de arbitragem e mediação e por pessoas ligadas ao meio em que se praticam os métodos privados e extrajudiciais de solução de conflitos. Exemplo desses estudos foi a inclusão do tema da arbitragem tributária em um dos Encontros Nacionais do CONIMA – Conselho Nacional das Instituições de Mediação e Arbitragem, realizados anualmente nas diversas regiões do país.
A adoção da arbitragem tributária foi largamente debatida por integrantes do governo, do Judiciário e do Ministério Público Federal, por professores e por advogados de dez estados e do Distrito Federal. Outras instituições ligadas à comunidade arbitral também incluíram esse tema em seus congressos e seminários, fazendo crescer no ano de 2015 os estudos para a adoção da arbitragem tributária no Brasil. Paradoxalmente — e provavelmente –, esse crescimento se deveu porque a arbitragem tributária foi praticamente esquecida na reforma do sistema legal de solução adequada de conflitos fora do Judiciário realizada em 2015.
Mas não apenas a arbitragem vem se expandindo a partir da reforma de 2015. Também a mediação privada e a mediação judicial receberam significativa atenção da sociedade como um todo a partir da aprovação do seu marco legal. As principais instituições privadas de arbitragem passaram a incluir a mediação em suas atividades e em seus regulamentos. As instituições científicas e de boas práticas passaram a considerar a mediação em suas atividades.
E não só a mediação privada passou a merece maior atenção da sociedade no ano de 2015. Também no Judiciário brasileiro a mediação judicial, ao lado da conciliação, passou a ser estudada, incentivada e disciplinada a partir das iniciativas do Conselho Nacional de Justiça nessa direção e da adesão dos Tribunais de Justiça dos Estados e dos Tribunais Regionais Federais a essa ferramenta de solução de conflitos judicializados.
Ampliou-se em 2015 a realização de cursos de capacitação de mediadores; a profissionalização da atuação deles na estrutura do Judiciário; a inclusão da mediação nas atividades de instituições que antes se dedicavam apenas à arbitragem; o interesse da sociedade com a perspectiva de a mediação ser instrumento de solução de conflitos que de outra forma seriam judicializados. Tudo isso veio contribuir, a partir do ano de 2015, para a rápida ampliação dessa importante ferramenta de pacificação de litígios.
E mais: Em 2015 se deu o lançamento nacional do Pacto da Mediação, instrumento que promove o compromisso da sociedade de evitar a judicialização dos conflitos e de utilizar a mediação como meio adequado para solução diretamente entre as partes. O Pacto da Mediação traz para a cultura de nossa sociedade o valor essencial de que se deva, mais e mais, evitar que conflitos ou controvérsias se transformem em litígios judiciais.
Cabe registrar ainda mais uma notável inovação introduzida também no ano de 2015 em nosso sistema jurídico de solução extrajudicial de conflitos, qual seja, a autocomposição administrativa de litígios com a Administração Pública, referida anteriormente. Idealizada inicialmente como ferramenta de solução de conflitos internos entre os próprios órgãos de governo, a disciplina legal desse instituto foi além desse limite e ampliou o escopo da autocomposição administrativa também para os conflitos entre a administração pública e a sociedade em geral.
Por iniciativa da Advocacia Geral da União, grande parte da hoje chamada Lei de Mediação [Lei 13.140/2015], veio disciplinar também a autocomposição administrativa de litígios com a Administração Pública, tratando detalhadamente da solução extrajudicial de conflitos envolvendo a administração pública federal, estadual, distrital e municipal. Com isso, se ampliou o universo dos métodos extrajudiciais de solução de controvérsias, pouco frequentado pelos governos que, como se confirmou pela pesquisa do Conselho Nacional de Justiça, são os maiores litigantes judiciais do país.
A autocomposição administrativa poderá compreender novas ferramentas como (i) a mediação coletiva de conflitos relacionados à prestação de serviços públicos (art. 33); (ii) a transação por adesão em controvérsias jurídicas pacificadas por jurisprudência do Supremo Tribunal Federal e dos tribunais superiores (art. 35); (iii) a resolução de conflitos entre particulares perante as agências e órgãos reguladores de certas atividades (art. 43); (iv) a composição de controvérsias jurídico-tributárias perante a Receita Federal do Brasil e sobre a dívida ativa da União (art. 38).
A disciplina legal para a autocomposição extrajudicial de conflitos envolvendo a administração pública representa, portanto, inovador avanço para reduzir significativamente os milhões de processos levados ao Judiciário por ou contra órgãos de governo e a elevada litigiosidade judicial da Administração Pública.
O ano de 2015 representa, por isso tudo, um extraordinário divisor de águas no sistema brasileiro de redução da litigiosidade judicial e de pacificação social no Brasil. A consolidação do marco legal da mediação, a modernização e ampliação da arbitragem, a disciplina da autocomposição administrativa de litígios com a administração pública, o uso cada vez maior da conciliação nas várias instâncias do Judiciário e a crescente adoção dos demais métodos adequados de solução extrajudicial de controvérsias são evidência do notável impulso que esses institutos trouxeram, no ano de 2015, para a pacificação da sociedade brasileira.
A partir da reforma de 2015, teremos a oportunidade de testemunhar nos anos seguintes o desenvolvimento seguro e adequado desses institutos e a ampliação de sua aplicação prática no Brasil, enriquecendo o sistema multiportas de escolha, pela sociedade, dos métodos mais adequados para a solução de litígios no Brasil. Assim esperamos.
Por Roberto Pasqualin, sócio sênior em PLKC Advogados e presidente do Conselho Nacional das Instituições de Mediação e Arbitragem (CONIMA)
Fonte: Revista Consultor Jurídico, 27 de dezembro de 2015, 8h00

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