Nos últimos anos, foram sensivelmente ampliados os mecanismos para obtenção de solução consensual de controvérsias, notadamente aqueles confiados à autoridade judicial e aos seus auxiliares.
Atualmente, diz-se, inclusive, que o ordenamento jurídico processual brasileiro consagra o chamado “princípio do estímulo da solução por autocomposição”, a orientar toda a atividade estatal na solução dos conflitos jurídicos.
No seu art. 3°, §3°, o Código de Processo Civil prevê que “A conciliação, a mediação e outros métodos de solução consensual de conflitos deverão ser estimulados por juízes, advogados, defensores públicos e membros do Ministério Público, inclusive no curso do processo judicial”.
O diploma processual civil estabelece uma distinção entre a conciliação e a mediação. A mediação é medida mais adequada nos casos em que tenha havido vínculo anterior entre as partes, a exemplo do que ocorre em matéria societária e de direito de família. O mediador, com o diálogo, paciência, simplicidade e esclarecimento constante, auxilia os interessados a compreender as questões e os interesses em conflito, de modo que eles possam, pelo restabelecimento da comunicação, identificar, por si próprios, soluções consensuais que gerem benefícios mútuos.
O mediador não sugere qualquer solução para o conflito (CPC, art. 165, §3°). O conciliador, por sua vez, deve atuar preferencialmente nos casos em que não tenha havido vínculo anterior entre as partes. Imagine-se os casos de acidentes de veículo ou naquelas hipóteses em que há danos extrapatrimoniais em geral.
O conciliador pode sugerir soluções para o litígio, sendo vedada a utilização de qualquer tipo de constrangimento ou intimidação para que as partes conciliem (CPC, art. 165, §2°). O que diferenciaria a mediação da conciliação seria a existência – ou não – de um vínculo anterior entre as partes. É preciso que se diga que a conciliação e a mediação não devem ser encaradas como medidas destinadas a desafogar o Poder Judiciário, mas, sim, como melhores e mais adequados meios de resolução de disputas. Essa compreensão brota da ideia de justiça multiportas, adotada pelo ordenamento processual brasileiro (CPC, art. 3°), que é a expressão de uma nova arquitetura para tutelar direitos.
Ao invés de se ter apenas uma única porta – que corresponderia à jurisdição tradicional, prestada pelo Poder Judiciário – passa-se para um modelo que garante diversas possibilidades, todas em igualdade de importância. Nesse sentido, embora indiretamente possam causar esse efeito, é certo reconhecer que o objetivo maior desses meios consensuais de resolução de conflitos não é servir como armas a serem utilizadas para efetivar a razoável duração do processo ou mesmo desafogar o Poder Judiciário. Constituem, na verdade, métodos adequados a resolver conflitos em determinadas circunstâncias, através das técnicas aplicadas por mediadores ou conciliadores, devidamente capacitados.
A solução negocial, ademais, para além de ser um meio adequado de resolução do litígio, encerra um instrumento importante de desenvolvimento da cidadania, em que os interessados passam a ser os atores principais da construção da decisão jurídica que regula as suas relações. O estímulo à autocomposição, portanto, acaba por reforçar a participação popular no exercício do poder – no caso, o poder de solução dos litígios.
Por Rosalina Freitas, Doutora e mestre em Direito. Professora de Direito Processual Civil. E Soraya Nunes, mestre em Direito, advogada, mediadora e professora de Mediação e Arbitragem
Fonte: Diário de Pernambuco – 16/05/2017 03:00
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